Por Luis Fernando Veríssimo
Que me perdoem os ávidos telespectadores do Big Brother
Brasil (BBB), produzido e organizado pela nossa distinta Rede Globo, mas
conseguimos chegar ao fundo do poço. A nova edição do BBB é uma síntese do que
há de pior na TV brasileira. Chega a ser difícil encontrar as palavras
adequadas para qualificar tamanho atentado à nossa modesta inteligência.
Dizem que Roma, um dos maiores impérios que o mundo conheceu,
teve seu fim marcado pela depravação dos valores morais do seu povo,
principalmente pela banalização do sexo. O BBB é a pura e suprema banalização
do sexo.
Impossível assistir ver este programa ao lado dos filhos.
Gays, lésbicas, heteros… todos na mesma casa, a casa dos “heróis”, como são
chamados por Pedro Bial. Não tenho nada contra gays, acho que cada um faz da
vida o que quer, mas sou contra safadeza ao vivo na TV, seja entre homossexuais
ou heterossexuais. O BBB é a realidade em busca do IBOPE. Veja como Pedro Bial
tratou os participantes do BBB. Ele prometeu um “zoológico humano divertido”.
Não sei se será divertido, mas parece bem variado na sua mistura de clichês e
figuras típicas.
Pergunto-me, por exemplo, como um jornalista, documentarista
e escritor como Pedro Bial que, faça-se justiça, cobriu a Queda do Muro de
Berlim, se submete a ser apresentador de um programa desse nível. Em um e-mail
que recebi há pouco tempo, Bial escreve maravilhosamente bem sobre a perda do
humorista Bussunda referindo-se à pena de se morrer tão cedo. Eu gostaria de
perguntar se ele não pensa que esse programa é a morte da cultura, de valores e
princípios, da moral, da ética e da dignidade.
Outro dia, durante o intervalo de uma programação da Globo,
um outro repórter acéfalo do BBB disse que, para ganhar o prêmio de um milhão e
meio de reais, um Big Brother tem um caminho árduo pela frente, chamando-os de
heróis. Caminho árduo? Heróis? São esses nossos exemplos de heróis? Caminho
árduo para mim é aquele percorrido por milhões de brasileiros, profissionais da
saúde, professores da rede pública (aliás, todos os professores) , carteiros,
lixeiros e tantos outros trabalhadores incansáveis que, diariamente, passam horas
exercendo suas funções com dedicação, competência e amor e quase sempre são mal
remunerados.
Heróis são milhares de brasileiros que sequer tem um prato de
comida por dia e um colchão decente para dormir, e conseguem sobreviver a isso
todo dia.
Heróis são crianças e adultos que lutam contra doenças
complicadíssimas porque não tiveram chance de ter uma vida mais saudável e
digna.
Heróis são inúmeras pessoas, entidades sociais e
beneficentes, Ongs, voluntários, igrejas e hospitais que se dedicam ao cuidado
de carentes, doentes e necessitados (vamos lembrar de nossa eterna heroína
Zilda Arns).
Heróis são aqueles que, apesar de ganharem um salário mínimo,
pagam suas contas, restando apenas dezesseis reais para alimentação, como
mostrado em outra reportagem apresentada meses atrás pela própria Rede Globo.
O Big Brother Brasil não é um programa cultural, nem
educativo, não acrescenta informações e conhecimentos intelectuais aos
telespectadores, nem aos participantes, e não há qualquer outro estímulo como,
por exemplo, o incentivo ao esporte, à música, à criatividade ou ao ensino de
conceitos como valor, ética, trabalho e moral. São apenas pessoas que se
prestam a comer, beber, tomar sol, fofocar, dormir e agir estupidamente para
que, ao final do programa, o “escolhido” receba um milhão e meio de reais. E ai
vem algum psicólogo de vanguarda e me diz que o BBB ajuda a “entender o
comportamento humano”. Ah, tenha dó!!!
Veja o que está por de tra$$$$$$$$$ $$$$$$$ do BBB: José
Neumani da Rádio Jovem Pan, fez um cálculo de que se vinte e nove milhões de
pessoas ligarem a cada paredão, com o custo da ligação a trinta centavos, a
Rede Globo e a Telefônica arrecadam oito milhões e setecentos mil reais. Eu vou
repetir: oito milhões e setecentos mil reais a cada paredão.
Já imaginaram quanto poderia ser feito com essa quantia se
fosse dedicada a programas de inclusão social, moradia, alimentação, ensino e
saúde de muitos brasileiros? (Poderia ser feito mais de 520 casas populares; ou
comprar mais de 5.000 computadores).
Essas palavras não são de revolta ou protesto, mas de
vergonha e indignação, por ver tamanha aberração ter milhões de
telespectadores. Em vez de assistir ao BBB, que tal ler um livro, um poema de
Mário Quintana ou de Neruda ou qualquer outra coisa…, ir ao cinema…. , estudar…
, ouvir boa música…, cuidar das flores e jardins… , telefonar para um amigo… ,visitar
os avós… , pescar…, brincar com as crianças… , namorar… ou simplesmente dormir.
Assistir ao BBB é ajudar a Globo a ganhar rios de dinheiro e destruir o que ainda
resta dos valores sobre os quais foi construída nossa sociedade.