Lembranças do Passado...
Eu estudei entre os anos de 1976 e 1979, no Colégio Santa Maria Madalena, na época; o único colégio particular da cidade; frequentado pelos estudantes de classe média da região e alguns estudantes bolsistas.
Na sétima série, chegou um novo aluno na minha sala. Era um
negro baixo e gordo, muito mais velho do que a maioria dos alunos da sala por
nome de José Claudino da Silva Filho, tendo o pai o mesmo nome e a sua mãe
chamava-se Benedita; e que residiam na Rua Legião Brasileira (como ele mesmo
dizia), quando alguém se referia ao logradouro como “atrás do mercado”. De
família humilde, Zé Claudino frequentava a escola com uma bolsa doada pelo
diretor, o Sr. José Correia Viana. O pai
sapateiro e mãe doméstica viviam na labuta diária com mais três filhos, sendo
mais um homem e duas mulheres.
Logo se enturmou e era amigo de todos, pois sabia cativar as
pessoas com o seu esplendoroso senso de humor, que fazia com que todos
gostassem de ficar perto dele. No recreio, depois do lanche, os mais chegados, se reuniam em torno dele para
ouvir mais um sessão de piadas e causos.
A zoeira era total! E só acabava quando tocava a sineta para voltarmos à
sala de aula.
O “Negão”, como eu o chamava era muito boa gente. Gostava de
aguardente e de um “baseado”, mas bem
reservado. Curtia o “barato” dele sem mexer com
ninguém. Mas gostava de aprontar com os
amigos.
Às sextas-feiras, à noite, nas biroscas e banca de feras ao
lado do mercado municipal, várias pessoas iam comer o delicioso sarapatel,
degustando uma cachaça temperada, com ervas e frutas da região.
Conta-se que certa vez um estudante
de medicina, trouxe para casa, uma orelha humana para fins de estudo. Chegando
em casa ,deixou os livros e foi, como de costume, comer um sarapatel e sorver
algumas doses de aguardente, jogando conversa fora e, com ele levou a orelha.
Aproveitando a distração, Zé Claudino retirou a orelha do bolso do acadêmico,
cortou em pequenos pedaços e misturou ao sarapatel que fora servido pela
proprietária do estabelecimento comercial. Todos que estavam ali comeram da inusitada iguaria, mas dessa vez
reclamando que tinha alguns pedaços que não teria cozinhado direito.
Depois de muito sarapatel com cachaça, o futuro médico deu
por falta da orelha e começaram a procurar enquanto o sacana do Zé Claudino, às
gargalhadas dizia: Vocês comeram a orelha
do defunto!
Não sei a explicação que o estudante deu ao seu mestre sobre
o paradeiro da orelha, só sei que naquele dia vários dos participantes da
farra, passaram a noite colocando o dedo na goela, para regurgitar a iguaria
escabrosa.
Foram muitas estórias com esta em que contamos com a
participação do bom malandro Zé
Claudino, sobretudo porque a amizade dele perpassou os muros do colégio.
Com a família, mudou-se para Maceió. Neste período,
envolveu-se com drogas e com o tráfico e depois soubemos com muito pesar do
desaparecimento dele. Não sei ainda informar se encontraram o corpo para fazer
um sepultamento digno
Sinto saudade do amigo Zé Claudino, o cara que era tão bem
humorado que ria da sua própria situação. Da falta de dinheiro, da desordem da
sua casa, do extremo nível de pobreza. Este era Zé Claudino, o bom malando.
Joaquim Maria